sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

A ti, corpo cansado

Tomba-te de uma vez, corpo vil!
Invólucro do nada, do vazio
Pois que minha alma desgraçada
Já se esvaiu pela fenda da ferida

Não lutes uma batalha já perdida
Aceita esta tua sorte que é maldita
Mas é a única que o destino reservou
Para este teu insistente "viver de amor"

Quando estiveres convulso
Não te aproveites de um impulso
Para tentar novo levante
Rende-te à febre, à dor lacerante

Não busques naquele anjo melancólico
Que te abraça e jura que te ama
Refrigério para teu enfadonho drama
Deixe logo que se apague tua chama

Aceita, corpo cansado, o teu destino
A morte - para uns hora temida
Para ti alegre sorte, única saída
Que assim liberas tua alma a descansar no paraiso

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

A ti, poeta vil

Tentaste-me seduzir com tua poesia vil
Escolheste vocábulos dóceis
Talhaste bem as estrofes
Deste aos versos fluído tranquilo

Tentaste-me cegar para que eu não visse
O quão miserável era o que me querias dar
Como era mísero este teu "amar"
Egoísta, pequeno, louco!

E quase me perdi no que disseste
Fadando-me à prisão de um destino sórdido
Pois que condenação mais perversa há
Que a de jamais provar do que o verdadeiro amor pode dar?

Mas tua poesia chafurda na lama, poeta!
É porca, é vil, é nojenta!
E a lama irrita, uma hora, aos olhos sensíveis
E os versos, então, já não são críveis

Estranha saudade

Ontem chorei de saudade
Dos beijos que ainda não demos
Do amor que jamais fizemos
Das juras eternas que nao me fizeste

E era uma saudade louca
Do teu calor que ainda não senti
Dos teus prazeres que eu não conheci
Do teu toque suave que minha pele não sentiu

E essa saudade do que ainda não vivi
Consome-me a alma frágil de poetisa
A nostalgia invade-me, se vem a brisa
Ou se ouço ao longe o cantar de um colibri

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Desventuras

Dei-te o amor que nunca vislumbraste
Dei-te corpo e alma com os quais nao sonhaste
Dei-te a instabilidade juvenil
O porte meigo, quase infantíl

Dei-te os carinhos que jamais recebeste
Dei-te fresco suco, do qual nunca bebeste
E joguei os laços, nos quais te prendeste
E ali ficaste, na companhia vil da insegurança

Dei-me toda a ti, cada oculto pedaço
E entranhada em mim te veio a esperança
Que não te permitias ter
Porque me associaste à inconstância

E se te dei tão flagelantes sentimentos
Se te tirei o sono por noites e lancei-te ao relento
Foi por querer dar-te o amor que merecias
Por querer ser o teu anjo, tua alegria

Mas saibas que amor a mim me trouxe na bagagem
A idéia permanente do oasis, da miragem
O abraço frio e estreito da incerteza
E o medo infinito e lacerante

Por ti passei noites inerte
Em lágrimas gélidas e amargas
Não te ter, ao meu lado, onde estiveste
Neste meu leito onde sou mulher e sou menina
Fazia de minh'alma pobre náufraga
Nos sonhos onde antes navegava

A poesia é

A poesia grita
A poesia irrita
Meus ouvidos cansados

A poesia sai
Não pede licença
Não tem clemência

Os versos suplicam
Que eu os faça fluir
Que os deixe sair

A poesia machuca
O peito lacerado
Do poeta exausto

A poesia é vil
Delírio febríl
Que consome a alma

A poesia é calma
É quimera
É verdade
É mentira

A poesia ama o vagabundo
A meretriz
A donzela
A cadela
O moribundo

A poesia é a fera
Que salta da jaula

A poesia é a flor
De aparência delicada

Tudo é poesia
E a poesia é tudo!

Ama-me

Ama-me, poeta, que a vida é breve
E está presa a um tênue fio
Que pode romper-se de repente
E levar-nos a conhecer da morte o frio

Ama-me, poeta, que o vento é leve
Mas um momento é o bastante
Para torná-lo vendaval
E varrer-nos um do outro num instante

Ama-me, poeta, que o viço passa
Que o tempo passa
E a própria vida passa

A juventude passa
E não seremos os mesmos
E estaremos a esmo
Chorosos do amor que perdemos

Ama-me enquanto nos embala
Esta doce e delicada sonata
Enquanto os olhos ainda contemplam a beleza
Da lua cheia na fria madrugada

Ama-me enquanto ainda podes
Toma-me, faz-me mulher
Que não quero tornar a chorar
Por ti uma gota sequer

Ama-me, que não quero a saudade
Daquilo tudo que não vivemos
Não quero o amargor de um sonho
Que realizar não pudemos

Por isto tudo, poeta, ama-me agora
Que nesta vida só a morte é certa
E o tempo... Ah, o tempo
Este logo vai-se embora

domingo, 20 de janeiro de 2008

Soneto do amor infinito

Amo-te com a doçura
Da rosa ainda pura
Pela primeira vez tocada
Pelo frescor da alvorada

Amo-te com a imperfeição
De tudo o que é perfeito
Amo-te com coração
Com a alma a me escapar do peito

E se te amo, com a fúria de uma fera
Se eu te amo além da espera
Além das penas e da saudade

Se eu te amo com a calma da brisa
Como a fênix ama a cinza
Toma-me, pois sou tua, por toda a eternidade

Minha oferta a ti

Tudo o que te ofereço é um amor errante
É o infinito de um instante
É um sentimento imperfeito

Ofereço-te a amante ingênua
A feiticeira, a amiga
A prostituta - donzela ambígua

Ofereço-te a segurança tênue
A efemeridade e a eternidade
O paradoxo em imensidade

Não te ofereço, amor, mais do que posso
E o que posso talvez seja pouco
Ou talvez seja louco
O amor, o amante

Ofereço-te, então, o que tenho
Um desejo ferrenho
De estar ao teu lado
E eternizar cada instante

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

No Fundo Dos Teus Olhos

No fundo dos teus olhos
Encontro segurança
Para ser insegura

No fundo dos teus olhos
Doce melancolia
Vívida alegria

No fundo dos teus olhos
Dois lumes de esperança
Remédios que me curam

No fundo dos teus olhos
Perco-me
Encontro-me

No fundo dos teus olhos
Meu refúgio
Minha fuga

No fundo dos teus olhos
Já não há mais a cidade
No fundo dos teus olhos
Esta estreita imensidade

No fundo dos teus olhos
Descanso
Espero

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Um Brinde

Brindemos à morte
Alegre sorte
Dos desventurados

Brindemos à noite
Que é como açoite
Ao coração enamorado

Brindemos às lágrimas
Que rolam amargas
De um rosto pálido

Brindemos à fadiga
De um corpo cansado
Já quase prostrado

Enfim brindemos ao amor
Paradoxo belo
De ventura e dor

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Versos Malditos

Maldigo minha própria poesia
Que não é nada, senão sentença cruel
Dada em palavras bonitas
Em métrica bem estabelecida

Maldita seja minha poesia
Que brota de um coração dilacerado
Por entre a dor, por entre o sangue
E sai pela fenda de um peito rasgado

Malditos ouvidos que a ouvem
O dos boêmios, que têm por teto a noite
E buscam alento num copo de vinho
Por terem querido a flor, e recebido o espinho

Tolos ébrios que caminham na direção da sentença
Matam-se de um amor venenoso que os consome
Não lembram que o poeta que profetiza a própria morte
Também conhece o destino dos demais amantes

Amor não é nada além de um sedutor
O algoz dos corações frágeis e sonhadores
Revela esplendorosamente seu furor
Para que não resistamos a morrer de amores

E quantas vezes ja se leu tal verdade em versos?
Quantos pobres condenados já não testemunharam a própria dor?
Mas que palavras duras se fazem necessárias para convencer o
[apaixonado
E tirar dos seus olhos a venda mágica que torna o carrasco um
[anjo de amor?